Semaglutida é remédio, não é cosmético; quando as canetas para obesidade e diabetes são indicadas
Canetas injetáveis são recomendadas para tratar obesidade ou diabetes tipo 2 — Foto: Freepik
Não é de hoje que as pessoas procuram a receita milagrosa para emagrecer. Dietas super restritivas, tomar só sopa por alguns dias, cortar todos os carboidratos, chás com várias ervas, água e limão em jejum. E agora dois medicamentos: a semaglutida e a liraglutida – substâncias muito parecidas com o hormônio GLP-1, que é produzido pelo nosso intestino, e vendidas em forma de “caneta”.
O que muita gente ignora (ou não sabe) é que essas canetas não são emagrecedoras. Elas são utilizadas para dois tratamentos bem definidos: diabetes tipo 2 e obesidade – duas doenças crônicas que precisam ser controladas e supervisionadas por profissionais capacitados.
(Esta reportagem faz parte de uma série do g1 sobre as canetas injetáveis para obesidade e diabetes tipo 2 para explicar como agem e quais os riscos; além de revelar quando o Wegovy será vendido no Brasil. Também vai trazer relatos de quem fez uso do medicamento; e o que fazer para emagrecer sem remédios.)
Cynthia Valério, endocrinologista e diretora da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), acrescenta que o tratamento de obesidade é complexo, envolve múltiplos fatores, além do uso de medicações.
“É um acompanhamento multidisciplinar e tem que existir uma mudança de estilo de vida. A medicação é uma ferramenta importantíssima que vai sustentar o processo, mas, quando utilizada de forma isolada e sem acompanhamento, é como se estivesse usando uma ferramenta valiosa de forma inútil“, completa a endocrinologista.
👉 Os medicamentos têm a tarja vermelha, ou seja, a venda depende da prescrição médica. Contudo, como a retenção da receita não é obrigatória, muita gente consegue comprar mesmo sem o pedido do profissional de saúde.
🚨 A obesidade é uma doença multifatorial, com estilo de vida e fatores genéticos que influenciam a composição corporal.
O Atlas Mundial da Obesidade 2023, publicado pela Federação Mundial de Obesidade (World Obesity Federation), estima que mais da metade do mundo terá obesidade ou sobrepeso até 2035. No Brasil, a doença deve atingir 41% da população adulta.
1 – Quem pode usar as canetas?
Como explicamos acima, existem medicamentos para diabetes tipo 2 e para o tratamento de obesidade. Abaixo, falamos sobre as canetas indicadas para essas doenças.
O Saxenda, que tem a liraglutida como princípio ativo, está disponível e liberado para o uso diário. Já o medicamento com semaglutida aprovado para obesidade no Brasil é o Wegovy, de uso semanal.
Como ele ainda não está disponível no país, pessoas estão recorrendo ao Ozempic (usado para diabetes tipo 2), que contém a mesma substância. No entanto, é sempre importante ressaltar que esse uso é off label, ou seja, fora da bula. Por isso, deve ser acordado entre médico e paciente.
Tipos de caneta injetável — Foto: Luisa Rivas | Arte g1
🔎 NA BULA: Os dois medicamentos são indicados como coadjuvantes à redução de calorias e aumento da atividade física em adultos com Índice de Massa Corporal (IMC) inicial maior ou igual a 30 (obesidade) ou maior ou igual a 27 (sobrepeso), que tenha alguma comorbidade relacionada, como hipertensão, diabetes, problemas respiratórios durante o sono, artrite.
Trujilho explica que, para ter indicação de uso das substâncias, a pessoa tem que ter inicialmente tentado a perda de peso através de mudança de estilo de vida. Se ela não conseguiu, se o resultado não foi satisfatório, aí o medicamento pode ser recomendado pelo médico.
2 – E quem NÃO pode usar?
Wegovy: medicamento está aprovado para o tratamento de obesidade — Foto: Reprodução
- As canetas são contraindicadas para pessoas que têm alergia a qualquer componente do medicamento.
- Se a pessoa ou alguém da família teve ou tem um tipo de câncer de tireoide chamado carcinoma medular de tireoide (CMT) também é contraindicado.
- E claro, ele não é indicado para grávidas e lactantes.
A bula traz outras advertências e precauções, como a síndrome de neoplasia endócrina múltipla tipo 2 (NEM 2), e atenção se tiver dor abdominal grave e contínua, retinopatia, problemas renais.
“Se a pessoa tem histórico de pancreatite, precisa ter cuidado. Um histórico clínico bem detalhado vai avaliar se o paciente é alguém que tem poucos riscos do uso do medicamento. Por exemplo, se a pessoa tem síndrome do cólon irritável, ela não tem contraindicação absoluta, mas, se for usar, se o médico achar que é uma boa opção, precisa ser mais cuidadoso”, explica o endocrinologista.
3 – Ter estratégia para não gastar dinheiro à toa
“Precisamos ter cuidado quando falamos sobre medicamentos para tratamento da obesidade. Ele precisa estar inserido em uma estratégia de tratamento da doença chamada obesidade e separar de emagrecimento, que é associado ao lado estético”, ressalta Trujilho.
⚡ Os especialistas ouvidos pelo g1 fazem o alerta principalmente para quem procura a semaglutida e a liraglutida apenas para emagrecer alguns quilinhos para entrar no vestido, por exemplo.
Estudos mostraram a eficácia e segurança dos medicamentos para os tratamentos previstos em bula, mas não há garantias que ele vai funcionar para todo mundo.
Vale lembrar que nem todos irão responder aos medicamentos. Algumas pessoas utilizam as canetas e acabam não perdendo peso. Por isso, é muito importante planejamento antes de ir à farmácia comprar os medicamentos.
💲 O g1 consultou os preços em três farmácias diferentes: o Ozempic 1 mg (usado off label para obesidade) custa cerca de R$ 1 mil. Já o Saxenda (liraglutida), em torno de R$ 700.
“Os pacientes que fazem uso sem acompanhamento criam expectativas irreais, querem a mesma resposta do vizinho, do parente, do amigo que utilizou a medicação. Mas a resposta é sempre individualizada. O parâmetro para saber quem é o bom respondedor, o mais resistente, isso é determinado pelo médico”, diz a diretora da Abeso.
4 – Reganho de peso
É comum encontrar relatos de pessoas que fizeram uso dos remédios (com ou sem indicação médica), perderam peso, mas tiveram um reganho depois de parar.
Os medicamentos devem ser usados como parte do tratamento, que também conta com mudanças de estilo de vida (alimentação, exercício físico, sono de qualidade), e não como uma fórmula mágica.
Se a pessoa não tiver uma estratégia bem definida com os profissionais de saúde, ela vai gastar dinheiro à toa.
“As pessoas acham que vão tomar a semaglutida, vão emagrecer e vão conseguir manter o peso sem acompanhamento médico. Quando a pessoa perde peso, o organismo vai desencadear mecanismos para que ela tenha reganho. É preciso ter um tratamento, uma estratégia para administrar a dosagem do medicamento”, completa o diretor da SBEM.
E o reganho de peso (ou efeito sanfona) é perigoso para a saúde. O processo constante de emagrece-engorda tem um impacto negativo no coração e pode provocar diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares e alteração do metabolismo, mesmo para quem não está acima do peso.
O endocrinologista faz mais um alerta para quem está usando as canetas: