Depois de voltar aos holofotes pelas mãos do almirante Bento Albuquerque, ex-ministro de Minas e Energia, a expansão da energia nuclear no Brasil já não é uma certeza, apesar dos esforços dos agentes do setor para tentar garantir investimentos na área.
A finalização da usina nuclear de Angra 3, várias vezes adiada, por exemplo, caminha a passos lentos. Se não for acelerada, poderá ter a previsão de começar a operar em 2028 mais uma vez alterada.
Para tentar impulsionar o setor, uma Frente Parlamentar Mista de Tecnologias e Atividades Nucleares foi criada no último dia 21, com previsão de ser instalada agora em abril. A expectativa dos parlamentares é de que não apenas Angra 3 seja concluída, mas que a quarta usina nuclear prevista para o País também saia do papel. Mas essa é uma hipótese hoje considerada remota.
Procurado para falar sobre o tema, o Ministério de Minas e Energia, disse, em nota, que está “estudando e analisando todas as questões referentes à energia nuclear no Brasil”. “As ações relacionadas ao tema serão divulgadas pela pasta, no momento oportuno”, disse.
Uma saída para a fonte crescer no País, avaliam especialistas do setor, seria a opção por pequenos reatores modulares, uma nova tecnologia que já possui mais de 50 projetos sendo desenvolvidos em países como Estados Unidos, Japão, China, Rússia, França, entre outros.
“No Brasil, a energia nuclear não é tão importante do ponto de vista da descarbonização, como é na Europa, na China. Mas garante a segurança do abastecimento diante do crescimento das renováveis, só que com juros a 13,75%, grandes projetos estão descartados. Pequenos reatores modulares são menos intensivos em capital”, explica Nivalde de Castro, professor do Instituto de Economia da UFRJ e coordenador do Gesel (Grupo de Estudos do Setor Elétrico).
Nivalde diz que a introdução dos SMR (Small Modular Reactor), como são mais conhecidos, pode ajudar a desenvolver uma cadeia produtiva no País, o que se alinha com a reindustrialização proposta pelo atual governo.
Da mesma visão compartilha o ex-presidente da Eletronuclear e atual assessor da presidência da ENBPar, controladora da usina hidrelétrica Itaipu e da Eletronuclear, Leonam Guimarães. Ele reforça que o maior obstáculo para a construção das usinas nucleares no Brasil é o custo do capital. Segundo ele, os pequenos reatores poderiam inclusive ser flutuantes e instalados próximos à outras usinas nucleares, em Angra dos Reis (RJ), para aproveitar a infraestrutura da central nuclear.
“Em vez de fazer uma usina de mais de 1 gigawatt (GW), como Angras 2 (1,3 GW) e 3 (1,4 GW), pode fazer quatro de 350 megawatts (MW) no mesmo local, fica mais econômico. Os primeiros 350 MW começam a gerar receita enquanto você está fazendo o segundo”, explica Guimarães. Para a construção de um pequeno reator o prazo estimado é de três anos, informa, bem abaixo dos mais de 10 anos das grandes usinas.
A energia nuclear no Brasil sempre foi um processo demorado, turbulento e muito caro. Desde os primeiros acordos com a Alemanha durante a ditadura, até os casos de corrupção na construção de Angra 3, a imagem do setor ainda passou por episódios rocambolescos, como o anúncio da construção de uma usina por ano em 50 anos pelo ex-ministro Edison Lobão, em 2008.
Mas pouca coisa saiu do papel. A partir do início da operação de Angra 2, em 2001, a geração de energia nuclear responde apenas por 1,66% de toda a eletricidade consumida no Brasil, e a fonte ainda vive o estigma de grandes acidentes no mundo, como os de Chernobyl (1986) e Fukushima (2011), os mais recentes.
O principal argumento em favor dos investimentos em energia nuclear no Brasil é estabilidade que ela pode trazer ao sistema elétrico, em contraponto às intermitentes gerações de energia eólica e solar, duas fontes que dispararam em capacidade instalada no país. Outro argumento é a futura produção de hidrogênio verde, que depende, no entanto, da classificação da energia nuclear como energia renovável, como pede a União Europeia.
Apesar de não emitir gases poluentes, a geração de energia nuclear depende do urânio, que não é renovável, e de muita água para esfriar os reatores. Além disso, a questão dos resíduos radioativos ainda não foi solucionada. Estudos sobre outro tipo de combustível para alimentar as usinas nucleares estão em andamento, mas ainda não existe um substituto renovável conhecido.
Por outro lado, o Brasil tem a 7.ª maior reserva de urânio do mundo, com a produção retomada em 2021, após cinco anos paralisada. Em 29 de dezembro do ano passado, o governo Bolsonaro sancionou a lei que permite a exploração pela iniciativa privada.
G1