Em janeiro, os agentes do mercado previam que o dólar fecharia 2024 valendo R$ 4,92. Esse tempo, porém, ficou para trás. Na última sexta-feira (1º/11), ele fechou a R$ 5,82, o maior patamar desde 2020. Agora, a questão é saber até onde vai essa cotação e quais as consequências para os brasileiros das recentes estilingadas da moeda americana.
Subiu por quê?
Isso posto, o ponto é entender por que a moeda americana vem mudando de patamar desde 2024. Para Ribeiro, houve uma “reprecificação do dólar na economia global”, que resultou em uma “mudança nos parâmetros de risco”.
“Essas alterações ocorreram mais acentuadamente por conta do cenário global do que no local”, diz o pesquisador. “E sempre que as incertezas aumentam as pessoas correm para se proteger no dólar, o que aumenta a cotação da moeda americana em todo o mundo.”
Fatores globais
No campo internacional, destaca Ribeiro, os mercados foram chacoalhados por dúvidas provocadas por guerras, o que inclui tanto os conflitos no Oriente Médio quanto na Ucrânia. Isso além da eleição americana, um fator mais recente. “Ela não era um evento inesperado”, afirma o economista. “Mas sua trajetória foi mais confusa do que as pessoas esperavam.”
Além disso, mudaram as perspectivas de cortes de juros nos Estados Unidos. No fim de 2023, os analistas apostavam que essas taxas seriam cortadas pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) em março. Isso, contudo, só ocorreu em setembro. Com os juros mantidos nas alturas, aumentou a atratividade dos títulos da dívida americana, os Treasuries, considerados os ativos mais seguros do mundo.
Com isso, o mercado americano passou a atuar como um aspirador de dólares, o que também contribuiu para elevar a cotação do dinheiro americano frente ao restante do mundo. Em relação a esse ponto, um levantamento feito pela consultoria Elos Ayta para o Metrópoles mostrou que, entre 27 moedas, somente três delas se valorizaram mais do que o dólar em 2024. A lista inclui apenas o dólar de Hong Kong, a libra esterlina (Reino Unido) e o rand sul-africano.
Estilingada no Brasil
Ribeiro observa que, apesar dos fatores globais, houve uma estilingada do dólar no Brasil, provocada por problemas não resolvidos por aqui, notadamente a questão fiscal (que trata das relações entre despesas e receitas do governo). Na última semana, o mercado mantinha a expectativa de que Brasília anunciaria corte de gastos, o que não ocorreu e provocou instabilidade no câmbio.
Além disso, nota Ribeiro, há problemas que não estão sendo abordados no noticiário, mas afetam a cotação do dólar. Um deles é a balança comercial, que consiste na diferença entre importações e exportações do país.
Balança menor
No fim de 2023, o mercado esperava um superávit (ou seja, um saldo positivo) de R$ 100 bilhões a R$ 120 bilhões na balança neste ano. Ocorre que ela deve fechar 2024 com um superávit bem menor. São cerca de US$ 80 bilhões, segundo relatório do Indicador de Comércio Exterior (Icomex), divulgado no mês passado pelo FGV Ibre.
Na prática, isso significa que um volume menor de dólares vai entrar no Brasil em relação ao que havia sido previsto no fim de 2023. Tal redução também contribui, embora não determine, com a valorização da moeda americana.
Uma indicação do peso dos problemas brasileiros na cotação atual do dólar também pode ser observada no levantamento da consultoria Elos Ayta. Segundo a pesquisa, entre os 27 países avaliados, o real foi a segunda moeda que mais se desvalorizou frente ao dólar em 2024, ficando à frente apenas do peso argentino.
Consequências para o brasileiro
E a alta cotação do dólar tem peso na vida dos brasileiros. “É inflação na veia”, diz Ribeiro. “O fato de a cotação ter chegado a R$ 5,82 na semana passada não é uma garantia de que haverá uma contaminação dos preços dos produtos, mas, se permanecer nesse patamar, sim. Ou seja, não é a estilingada que contamina a inflação, mas a permanência nesse nível.”
O dólar alto, acrescenta o pesquisador, pode afetar itens da alimentação, como as carnes, e os bens industriais, duas frentes que vinham colaborando com a queda da inflação nos últimos meses. Se tal cenário se confirmar, diz Ribeiro, o Banco Central vai ter de subir ainda mais os juros, ou mesmo, elevá-los em ritmo mais rápido. “O quanto vai aumentar depende de como o cenário vai se organizar, mas a direção é para cima”, afirma o economista.