Lembro emocionado, querida escola, do início dessa história, quando cheguei jovenzinho para participar da disputa de samba, no inesquecível “Sonhar com rei dá leão”. Joãosinho Trinta, também recém-chegado, criara o enredo sobre o jogo do bicho e eu, então Neguinho da Vala, sonhava entrar para a ala de compositores. O saudoso carnavalesco permitiu que eu tentasse – e deu certo. Com o samba composto por mim, fomos campeões.
De lá para cá, você ganhou 14 carnavais, e me concedeu o privilégio de estar presente em todos. Fomos tricampeões duas vezes, levamos o Cristo mendigo coberto pela censura, na imagem mais conhecida do Carnaval. E o mais importante: inserimos a Beija-Flor de Nilópolis na história da maior festa popular do Brasil. Em lugar de protagonista.
Consolidou-se a Maravilhosa e Soberana, como está no nosso hino-exaltação, “Deusa da Passarela”, que tive a honra de compor. E virou seu merecido apelido no planeta Carnaval.
Por você, venci o câncer, cantando na avenida ainda sob tratamento. Tenho fé que me curei graças a Deus e ao abençoado remédio do Carnaval. Nunca esquecerei como a comunidade me recebeu, na volta aos ensaios, em nossa quadra sagrada. O aplauso e a montanha de carinho estão para sempre tatuados na memória.
Por isso e muito mais, jamais cogitei receber salário da Beija-Flor. Nunca assinei contrato nem me submeti a qualquer burocracia. Nossa relação é única e dispensa protocolos. Costumo repetir que se alguém deve algo, sou eu a você, minha escola. Tenho muito orgulho de carregá-la em meu nome oficial, o da carteira de identidade: Luiz Antonio Feliciano Neguinho da Beija-Flor Marcondes.
Guardo como um tesouro a primeira carteira de integrante da ala de compositores. Está lá a data, 11 de junho de 1975, do começo de tudo. Dos companheiros originais, ainda estão aqui o patrono Anísio Abrahão David e a querida Pinah. Começamos juntos a aventura de conduzir uma pequenina escola da Baixada Fluminense ao panteão das gigantes de nossa cultura popular. E chegamos lá, com a participação de muitos outros sambistas que vieram depois e seguirão rumo ao futuro.
Chegou a minha hora. Em 2025, cantarei a exaltação de meu parceiro Laíla – a quem conheci ainda antes do primeiro Carnaval, na lendária roda de samba do Bola Preta –, como epílogo dessa odisseia que durou meio século de folia e felicidade. Superou muito meus melhores sonhos. E continuarei lhe amando. Você pode contar comigo por toda a eternidade.
Obrigado por tudo, minha escola, minha vida, meu amor.
Olha a Beija-Flor aí, gente!
G1