Recentemente liberada no Brasil, a função “Comunidades” do WhatsApp tem potencial para ampliar a viralização de conteúdos políticos com desinformação que circulam no aplicativo de troca de mensagens. O alerta é de pesquisadores e advogados especialistas em Direito e comunicação digital ouvidos pelo GLOBO.
O recurso permite aos usuários organizar até 50 grupos em uma espécie de “guarda-chuva” com temáticas semelhantes e mandar mensagens para até cinco mil pessoas. Somente os administradores das comunidades têm permissão para enviar conteúdos a todos os membros nesse novo ambiente. Antes só era possível atingir simultaneamente até 256 usuários por meio dos grupos do aplicativo.
O risco de a ferramenta facilitar a propagação de desinformação também foi citado em um ofício enviado, no ano passado, ao WhatsApp pelo Ministério Público Federal (MPF). Na ocasião, em meio ao risco de impacto nas eleições, o órgão solicitou o adiamento da implementação do recurso para o início deste ano, o que foi acatado pela plataforma.
Professor da FGV Direito Rio e coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV, Luca Belli diz que os mecanismos de segurança da plataforma tornam o rastreamento de conteúdos na nova ferramenta ainda mais difícil:
— Pode ser particularmente pernicioso em termos de divulgação de fake news, porque é uma rede sujeita à criptografia.
Outro aspecto é a possibilidade de membros de uma comunidade transitarem em diferentes grupos que compõem essa nova rede. Nessa lógica, um usuário pode ir de um grupo para outro facilmente.
— Isso permite que o usuário entre em grupos aos quais não se teria acesso — explica o professor de Estudos de Mídia da Universidade da Virgínia David Nemer, que monitora há anos grupos bolsonaristas na plataforma. — A ferramenta é uma forma de organizar e melhorar a circulação de informações. Mas vivemos um problema sério no qual tudo que toca na circulação de informação facilita também a desinformação.
Pulverização acelerada
Pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD), João Guilherme Bastos dos Santos vê um salto no potencial de propagação de desinformação. Um estudo publicado por Santos e outros pesquisadores em 2019, com base nas atividades de 90 grupos de WhatsApp nas eleições de 2018, apontou que a difusão viral de mensagens falsas sobre o pleito está ligada justamente à interconexão de grupos por participantes em comum:
— Passaremos a ter grupos gigantescos que vão acelerar a viralização no WhatsApp. É uma mudança significativa. Há potencial de apropriação disso por grupos que disseminam desinformação política. Se você manda um vídeo e os usuários fazem o download, passa a ter várias réplicas dele. Você acelera o processo.
O advogado Diogo Rais, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, avalia que a medida facilita o alcance de mais usuários, mas não cria um poder novo, já que antes era possível fazer o mesmo de forma pulverizada:
— As comunidades facilitam a propagação, mas essa organização, por outro lado, ainda que se mantenha a criptografia, pode ajudar a compreender qual a conta responsável pela mensagem, que é a que opera aquela grande comunidade.
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