Invasão em Brasília completa um mês; prejuízo chegou a R$ 21 milhões, e 1,4 mil foram presos
Falha na operação das forças de segurança possibilitou vandalismo na praça dos Três Poderes; episódio mudou cenário político do DF
Os atos de vandalismo na praça dos Três Poderes, em Brasília, completam um mês nesta quarta-feira (8). No último 8 de janeiro, Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal (STF) foram invadidos e depredados por vândalos, que quebraram vidraças, destruíram e roubaram obras de arte e danificaram cômodos e móveis dos três prédios. A informação é do R7.
O episódio deixou um prejuízo de ao menos R$ 21 milhões ao poder público, segundo estimativas feitas pelos Três Poderes, e ocorreu por falha na operação das forças de segurança pública do DF, de acordo com a equipe de intervenção que atuou na capital federal depois do ocorrido.
Os erros nas estratégias para tentar conter os vândalos levantaram dúvidas de uma eventual omissão do Governo do DF em relação aos ataques e fizeram com que o governador Ibaneis Rocha (MDB) fosse afastado do cargo por 90 dias, bem como motivaram a demissão do secretário de Segurança Pública Anderson Torres, que está preso pela suspeita de ter facilitado a ação dos extremistas.
Nesses 31 dias que se passaram desde os ataques, cerca de 1.400 pessoas foram presas por envolvimento nos atos de vandalismo. A Polícia Federal já deflagrou cinco fases de uma operação com o objetivo de identificar quem participou, financiou, se omitiu ou fomentou os atos ocorridos em 8 de janeiro.
Além disso, a Advocacia-Geral da União (AGU) pediu à Justiça o bloqueio de R$ 20,7 milhões de bens de presos por causa da depredação de Congresso, Planalto e STF. A Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou 653 pessoas por associação criminosa e por incitar a animosidade entre as Forças Armadas e os Poderes da República.
Prejuízo financeiro
Cada uma das instituições depredadas divulgou o impacto financeiro dos episódios de vandalismo. Segundo o STF, os danos à estrutura do prédio foram estimados em R$ 5,9 milhões. No dia do ataque, uma réplica da Constituição de 1988 foi roubada. Contudo, o item foi recuperado e devolvido à Corte.
De acordo com a Presidência da República, o prejuízo foi de no mínimo R$ 8 milhões para o Palácio do Planalto, valor referente ao quadro As Mulatas, de Di Cavalcanti, que foi rasgado pelos invasores.
Até o momento, o governo ainda não restaurou as obras que foram danificadas. Além do quadro de Di Cavalcanti, os vândalos depredaram artigos como a pintura Bandeira do Brasil, de Jorge Eduardo; a galeria de fotos dos ex-presidentes; a escultura O Flautista, de Bruno Giorgi; uma escultura de parede de madeira de Frans Krajcberg; a mesa de trabalho de Juscelino Kubitschek; e o relógio de Balthazar Martinot.
No Congresso, o Senado calculou o prejuízo em R$ 4 milhões e a Câmara, em R$ 3,3 milhões. Itens como a Tapeçaria, de Burle Marx; o Painel Vermelho, de Athos Bulcão; a Bailarina, de Victor Brecheret; o painel Candangos, de Di Cavalcanti; e o painel Alumbramento, de Marianne Peretti, foram danificados.
Segundo a Câmara, dos 46 presentes protocolares expostos no Salão Verde, 29 permaneceram íntegros, 12 foram danificados, 2 foram roubados e 3 foram destruídos. Entre esses itens, estão uma pérola do Catar e uma bola de futebol autografada por Neymar, ambas roubadas. A bola foi encontrada em Sorocaba (SP).
Ao menos três obras vandalizadas voltaram a ser expostas no Congresso: o quadro Trigal na Serra, de Guido Mondin, a escultura Bailarina e o muro escultórico de Athos Bulcão.
A AGU já pediu à Justiça Federal do Distrito Federal o bloqueio cautelar de R$ 20,7 milhões em bens dos presos. O órgão afirma que todos os responsáveis, sejam financiadores, sejam depredadores, devem responder solidariamente pelo prejuízo causado ao patrimônio público.
Pessoas envolvidas
A quantidade de pessoas presas por suspeita de envolvimento nos atos de vandalismo é de cerca de 1.400. Algumas delas respondem aos processos em liberdade e usam tornozeleiras eletrônicas.
Desse total, 653 foram denunciadas pela PGR por associação criminosa e por incitar a animosidade entre as Forças Armadas e os Poderes da República. O órgão pede que os crimes sejam considerados de forma autônoma e as penalidades, somadas. Dessa forma, a pena máxima pode chegar a três anos e seis meses de prisão.
A Polícia Federal deflagrou a Operação Lesa Pátria para identificar pessoas que tiveram relação com os atos. Até o momento, a corporação realizou 5 operações e cumpriu 17 mandados de prisão preventiva, 3 de prisão temporária e 37 de busca e apreensão.
A investigação da PF apura os crimes de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado, associação criminosa, incitação ao crime, destruição e deterioração ou inutilização de bem especialmente protegido.
Mudanças na política local
O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), continua afastado do cargo por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que disse que Ibaneis teve “conduta dolosamente omissiva” em relação aos atos de vandalismo. No lugar do emedebista, assumiu a vice dele, Celina Leão (PP).
Em depoimento à Polícia Federal, Ibaneis disse que determinou a retirada dos manifestantes de acampamentos montados em Brasília em 29 de dezembro, mas que foi impedido pelo Exército. “Respondi a todos os questionamentos e espero ter deixado claro que não tive nenhum envolvimento, seja por ação, seja por omissão, com os fatos”, afirmou.
Secretário de Segurança Pública à época da invasão, Anderson Torres foi exonerado por Ibaneis e, posteriormente, preso por ordem de Moraes, que também alegou “omissão e conivência” por parte do ex-secretário em 8 de janeiro. No dia dos atos de vandalismo, Torres estava de férias nos Estados Unidos.
O ex-secretário prestou depoimento à Polícia Federal na semana passada e afirmou que houve “falha grave” na ação da Polícia Militar na tentativa de impedir a invasão dos prédios públicos. Contudo, segundo ele, conter os manifestantes não era responsabilidade da secretaria, e sim da PM.
A PF pediu a Torres que entregasse o celular dele, mas o ex-secretário alegou que perdeu o aparelho. Ele disse que, após ter a prisão decretada, “passou a ser procurado por uma infinidade de pessoas, ocasião em que resolveu desligar o celular e que não sabe onde ele se encontra”. Torres disse que pode oferecer o login e a senha da nuvem para que a Polícia Federal acesse os arquivos.
No mesmo dia dos atos de vandalismo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decretou intervenção federal na segurança pública do DF, que durou até 31 de janeiro. No relatório final sobre o episódio na praça dos Três Poderes, o secretário-executivo do Ministério da Justiça, Ricardo Cappelli, responsável pela intervenção, afirmou que houve falha na operação das forças de segurança.
Segundo ele, faltou comando e responsabilidade de Anderson Torres, que não teria se preparado de forma contundente para frear os ataques, de acordo com Capelli.
R7